Quando me disseram que tinhas ressuscitado, compreensivelmente, e embora o desejasse ardentemente, tende piedade, não acreditei e disse-vos que só o creria quando introduzisse um dedo numa das Suas chagas.
Quando me disseram que passeavas pelas ruas de Jerusalém, mais vivo do que os muitos que vivos te seguiam, aproximei-me a medo e disseste-me:
Anda, Tomé, vem ver O que ressuscitou, O que voltou da morte. Que deixou a frieza da pedra para respirar o ar puro da Palestina. Que deslocou a pedra que O cobria com a força do desejo do Pai.
Caminhei para perto do homem, do amigo, que acompanhara pelas pedras e poeiras dos caminhos da Galileia e furei pelo meio da multidão ensandecida. Que falavas como nos conduzias antes, e parecias O que tinhas sido, não haveria dúvida nenhuma, mas das cinco chagas, de onde tinha visto escorrer da cruz o escarlate e morno sangue, nada vislumbrei. Na cabeça luzia uma fronte cobreada, bela e invicta. Do aro de espinhos nada restava que me aprouvesse observar. Cheguei-me mais perto ainda, e acariciei o teu peito nu e limpo. Olhei-Te demoradamente o corpo jovial e belo. Nada vi que me pudesse fazer crer no que me tinham dito. E fui-me dali chorando incréu e desolado. Só.
Quem contraria as leis da vida e da morte, vem nascido de novo como se de mãe virgem tivesse sido anunciado.
Cativa, 8.4.24