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A rolinha da esquerda, na foto, foi a que recusou a carícia.
Sem a minha pick up Ford Ranger e a música que dela emanava, a solidão teria sido insuportável. Ao fundo os fios eléctricos onde o desfecho feliz aconteceu.
Acabei finalmente a minha solitária campanha da alfarroba. Fiz a minha dança da felicidade à roda da última alfarrobeira apanhada (para grande diversão do meu vizinho poente, que me observava ao longe) e fui telefonar ao sr. Madeira para mas vir buscar. Às seis da tarde, quando um camião do referido comerciante de frutos secos abandonava, lentamente e carregadinho, a quinta, senti um imenso orgulho de dever cumprido. Para o ano haverá mais.
Há uns dias atrás, enquanto me arrastava por baixo duma copa densa de alfarrobeira enchendo umas caixas do fruto da dita, intui que estava a ser vigiado. Controlado com curiosidade a partir de cima. Ergui-me e deparei com um ninho ocupado por duas opulentas crias. Achei estranho. Por esta altura do ano já as jovens avezinhas deram à monte e preparam intensamente as suas defesas para o longo Inverno ou para a viagem de fuga a esta estação. Só depois constatei que se tratava de crias de rola. Esta ave cria várias vezes ao ano e daí esta cena outonal. Perante esta aparição mágica, corri a casa buscar a máquina fotográfica e registei a enternecedora parelha. Infelizmente, com a emoção, a maior parte das fotografias ficou desfocada, por isso apresento-vos apenas a que está lá por cima. Não contente com a apreciação visual da cena, estupidamente, estendi a mão para acariciar uma das crias. Como era de esperar saltou imediatamente do ninho e, para meu espanto voou para uma alfarrobeira próxima. Fiquei em pânico: conseguiria sobreviver? Seria capaz de voltar ao ninho? Os pais encontrá-la-iam? Só mais tarde me apercebi que o meu gesto foi, certamente, guiado por uma pulsão sexual inconsciente (desculpem a redundância). É que por estas paragem é costume nomear o órgão genital feminino de "rolinha". Foi para acariciar uma "rolinha" que a minha mão avançou, inconscientemente, na direcção do ninho. As rolinhas, como as "rolinhas", escapulem-se sempre perante investidas desajeitadas e imprevistas.
Como já era quase noite não pude acompanhar o que se passou a seguir. No outro dia corri à alfarrobeira maternal e... só lá estava a rolinha não acariciada. Da outra nem sinal. E eu destroçado. Pela tarde voltei ao lugar do crime e... rolinha nenhuma no ninho. No entanto ouvi um cu-cu-rru de rola vir de fora do pomar e segui o som. Quando saí do meio das alfarrobeiras, que me limitavam a visão, deparo-me com uma cena amorosa. Nuns altos fios de electricidade, com ar de felicidade que só os animais conseguem irradiar, pai, mãe e filhotes rolas preparavam o futuro. Senti um alívio enorme. Se calhar até era responsável por uma precoce emancipação dos filhotes vaidosos da sua autonomia.
curiosidades: a alfarroba vende-se às arrobas (15 Kgs) e está a ser comprada a 5 euros a arroba. Numa hora apanho entre 3 e 4 arrobas. Parece que o Japão é o grande importador de alfarroba algarvia ( a que preço será lá a arroba?). Os marroquinos estão a plantar milhares de hectares de alfarrobeiras. Quando estão a deliciar-se com um gelado Magnum, estão também a apreciar uma parcela de alfarroba neles contida.
PS: (acrescentado a 5 do corrente) O maior poeta português vivo e artista plástico, o meu amigo Rui Dias Simão, também andou na campanha da alfarroba para sobreviver. Conseguiu, com os proventos, pagar todas as dívidas acumuladas e amealhar algum dinheiro para o Inverno. Entretanto o seu último livro, Os Animais da Cabeça, está por aí a implodir. Quem já o leu, o que é o meu caso, diz que é verdadeiramente assombroso...
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