Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]


"Rolinhas" na copa de uma Alfarrobeira

por vítor, em 03.10.08

A rolinha da esquerda, na foto, foi a que recusou a carícia.

 

Sem a minha pick up Ford Ranger e a música que dela emanava, a solidão teria sido insuportável. Ao fundo os fios eléctricos onde o desfecho feliz aconteceu.

 

Acabei finalmente a minha solitária campanha da alfarroba. Fiz a minha dança da felicidade à roda da última alfarrobeira apanhada (para grande diversão do meu vizinho poente, que me observava ao longe) e fui telefonar ao sr. Madeira para mas vir buscar. Às seis da tarde, quando um camião do referido comerciante de frutos secos abandonava, lentamente e carregadinho, a quinta, senti um imenso orgulho de dever cumprido. Para o ano haverá mais.

 

Há uns dias atrás, enquanto me arrastava por baixo duma copa densa de alfarrobeira  enchendo umas caixas do fruto da dita, intui que estava a ser vigiado. Controlado com curiosidade a partir de cima. Ergui-me e deparei com um ninho ocupado por duas opulentas crias. Achei estranho. Por  esta altura do ano já as jovens avezinhas deram à monte e preparam intensamente as suas defesas para o longo Inverno ou para a viagem de fuga a esta estação. Só depois constatei que se tratava de crias de rola. Esta ave cria várias vezes ao ano e daí esta cena outonal. Perante esta aparição mágica, corri a casa buscar a máquina fotográfica e registei a enternecedora parelha. Infelizmente, com a emoção, a maior parte das fotografias ficou desfocada, por isso apresento-vos apenas a que está lá por cima. Não contente com a apreciação visual da cena, estupidamente, estendi a mão para acariciar uma das crias. Como era de esperar saltou imediatamente do ninho e, para meu espanto voou para uma alfarrobeira próxima. Fiquei em pânico: conseguiria sobreviver? Seria capaz de voltar ao ninho? Os pais encontrá-la-iam? Só mais tarde me apercebi que o meu gesto  foi, certamente, guiado por uma pulsão sexual inconsciente (desculpem a redundância). É que por estas paragem é costume nomear o órgão genital feminino de "rolinha". Foi para acariciar uma "rolinha" que a minha mão avançou, inconscientemente, na direcção do ninho. As rolinhas, como as "rolinhas", escapulem-se sempre perante investidas desajeitadas e imprevistas.

Como já era quase noite não pude acompanhar o que se passou a seguir. No outro dia corri à alfarrobeira maternal e... só lá estava a rolinha não acariciada. Da outra nem sinal. E eu destroçado. Pela tarde voltei ao lugar do crime e... rolinha nenhuma no ninho. No entanto ouvi um cu-cu-rru de rola vir de fora do pomar e segui o som. Quando saí do meio das alfarrobeiras, que me limitavam a visão, deparo-me com uma cena amorosa. Nuns altos  fios de electricidade, com ar de felicidade que só os animais conseguem irradiar, pai, mãe e filhotes rolas preparavam o futuro. Senti um alívio enorme. Se calhar até era responsável por uma precoce emancipação dos filhotes vaidosos da sua autonomia.

 

curiosidades: a alfarroba vende-se às arrobas (15 Kgs) e está a ser comprada a 5 euros a arroba. Numa hora apanho entre 3 e 4 arrobas. Parece que o Japão é o grande importador  de alfarroba algarvia ( a que preço será lá a arroba?). Os marroquinos estão a plantar milhares de hectares de alfarrobeiras. Quando estão a deliciar-se com um gelado Magnum, estão também  a apreciar uma parcela de alfarroba neles contida.

 

PS: (acrescentado a 5 do corrente) O maior poeta português vivo e artista plástico, o meu amigo Rui Dias Simão, também andou na campanha da alfarroba para sobreviver. Conseguiu, com os proventos, pagar todas as dívidas acumuladas e amealhar algum dinheiro para o Inverno. Entretanto o seu último livro, Os Animais da Cabeça, está por aí a implodir. Quem já o leu, o que é o meu caso, diz que é verdadeiramente assombroso...

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 21:51


Mais sobre mim

foto do autor


Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.


Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2022
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2021
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2020
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2019
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2018
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2017
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2016
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2015
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2014
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2013
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2012
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2011
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2010
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2009
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2008
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2007
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2006
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D