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Um poema de Rui Dias Simão
Monólogos de Bartolomeu Dias
na morte de sua esposa
1- Criação: vivem pelas arqueologias do silêncio
reunidos durante as cálidas insinuações
do fogo sobre a pedra
2- Orgasmo: palavras marmóreas aéreas descem
à fixidez do vermelho
3- Morte: sibilina modorra desprende a língua do fruto
nas mutações da chuva o rio engorda
um objecto cortante arde-me frio nos dedos
sei a pulsação do sangue
digo logo para mim essa nuvem
rebente profusa em teu nobre peito
4- Solidão: a solidão transporta o resto para
a penumbra dos esgotos
única musiqueta de todas as maneiras
intransponível
faca
aparecem na babugem os peixes mortos
até isso me vem parar
às minhas mãos sozinhas
A semana passada passei uma tarde a podar a minha buganvília vermelha. No Verão dá uma sombra refrescante e acolhedora mas no Inverno não deixa entrar o Sol pelas janelas e mantém o quintal húmido todo o tempo. Estava tão grande que parecia querer engolir a casa. É um trabalho terrivelmente perigoso porque a planta tem uns espinhos enormes, duros e pontiagudos. As minhas queridas mãozinhas que o digam. Saem sempre a sangrar desta tarefa. Mesmo sabendo que é uma tarefa necessária, tenho sempre pena de a fazer. Esta é uma buganvília que dá flor todo o ano e, mesmo não estando tão linda como no Verão, o desaparecimento das suas belas flores escarlates, parte-me o coração. Compensa-me saber que quando chegar a Primavera ela irá rebentar remoçada.
Hoje continuei com as podas. Novamente à volta de espinhosas e perigosas: as roseiras. 11 roseiras podadas e mais uma vez as mãos rasgadas. Desta vez não havia flores. Dormiam neste Inverno que vai longo. Daqui a dois meses embriagarão os ares com o seu cheiro e as suas cores. Vermelhas, rosas, amarelas, púrpuras. O trabalho será recompensado.
Um dia destes será o trabalho mais perigoso. Cortar as folhas das palmeiras. Deste tenho amargas recordações. Espetei um ponta de folha no peito do pé e fiquei com dores horríveis e dificuldades em andar durante dois meses. Até tive que usar uma velha bengala para me ajudar a caminhar. Entretanto fui ouvindo as mais diversas histórias sobre infecções, amputações, paralisias e outras homilias que me iam rezando amigos e conhecidos. As coisas recompuseram-se e hoje não há sequelas de tão grande susto. Com bicos de palmeira todo o cuidado é pouco, mas terei que o fazer.
Para falar de coisas mais doces e ternas: a minha horta vai linda. Salsa, rabanetes (sempre rabanetes), courgetes, espinafres, alfaces, morangos e quejandos enchem os olhos de quem os vê.
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