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Lembrava-se de tudo como se presenciasse a cena: à direita um actor de cinema com os olhos em bico do leite de coco com aguardente de cana. O crepitar da fogueira enchia a sala de recordações tristes. Embevecida no fogo estava ela. Porque fora ele meter-se naquele covil de lobos sem unhas?
Bebeu mais um copo. A cabeça recusava-se a pensar nas responsabilidades do dia a dia. Bebeu outro, de um trago só. Maldita cocaína, ouviu a consciência com voz grave de pai dos anos trinta.
Lendo uma revista pornográfica, desta vez à esquerda, estava um cavalheiro distinto mas sem gravata. Ela sorria avermelhadamente com a calma de quem jogava. Roleta russa.
Agora era o malvado joelho que teimava em não funcionar. Nem a perna conseguia cruzar. Que pontapé, essa gente devia era ser jogadora de futebol.
Na poltrona do meio dormitava um velho jornalista corroído por notícias de todo o mundo. Tinha sido, até, correspondente na Polinésia.
Ela chegara-se mais ao fogo como se precisasse de mais calor. Era a sua, dele, hora. Pé ante pé, chegou-se à lareira e, com a tenaz, retirou uma brasa do braseiro. Acendeu o cigarro à americana. Soprou o fumo, primeiro pelas narinas e depois através dos dentes.
Sentiu-se alarmado com as palavras que deixara escapar. O jornalista farejou notícia. O cavalheiro distinto sem gravata ousou mesmo esboçar uma retirada discreta, sem o conseguir. Pela porta dos fundos apareceu quem se esperava: o polícia secreto do governo sombra.
Sem conseguir reagir ao desencadear dos acontecimentos, e com dores acentuadas nas costelas, deixou-se prender por ele e... por ela.
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