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Falas de civilização, e de não dever ser,
Ou de não dever ser assim.
Dizes que todos sofrem, ou a maioria de todos,
Com as coisas humanas postas desta maneira,
Dizes que se fossem diferentes, sofreriam menos.
Dizes que se fossem como tu queres, seriam melhor.
Escuto sem te ouvir.
Para que te quereria eu ouvir?
Ouvindo-te nada ficaria sabendo.
Se as coisas fossem diferentes, seriam diferentes: eis tudo.
Se as coisas fossem como tu queres, seriam só como tu queres.
Ai de ti e de todos que levam a vida
A querer inventar a máquina de fazer felicidade!
(Alberto Caeiro, heterónimo de Fernando Pessoa)
Quando há dez mil anos a subida do nível do mar, provocada pelo degelo da última glaciação, isolou a Tasmânia do continente australiano, os indígenas pareceram ter perdido as competências para pescar, acender o fogo e coser. Regrediram em relação aos seus irmãos aborígenes da imensa ilha-continente , vivendo na maior simplicidade imaginável.
Em 1772 aportaram à ilha os primeiro colonos europeus. Os povos autóctones pouco se importaram com a sua presença e continuaram a seguir os seus modos de vida. Ou melhor, continuariam se os recém-chegados não lhes tivessem movido feroz perseguição. Não dispondo de qualquer defesa em relação aos invasores, rapidamente o seu número foi diminuindo e por volta de 1830 não passariam de 72, dos inicialmente 5 000 habitantes originais. Desde a chegada dos empreendedores colonos, foram utilizados como mão-de-obra escrava e como objectos sexuais e, sadicamente, torturados e mutilados. Foram caçados como animais e o governo oferecia vultuosas somas pelas suas (imaginem) peles. As mulheres dos homens mortos eram obrigadas a deambular com as cabeças dos maridos penduradas ao pescoço. As crianças mortas à paulada. Os homens que sobreviviam, castrados.
William Lanner , o último indígena do sexo masculino, deixou o mundo dos vivos em 1869. A sua cova foi aberta por um membro da Royal Society da Tasmânia, o Dr. George Stokell que (agarrem-se bem) fez da sua pele uma bolsa para tabaco. (Como Hegel bem demonstrou a lógica protestante é mesmo tramada para o negócio).
A última mulher aborígene pura da Tasmânia morreu poucos anos depois tendo-se, assim, consumado o genocídio.
(Parece uma história do princípio dos tempos, mas foi há menos de 200 anos ).
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