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A vida, esta vida, não faz sentido sem a morte. Paradoxalmente tudo fazemos para fugir a esta última. Uns escolheram o embuste já há muito traçado: a religião. Enganam a si próprios crendo numa vida eterna e bem melhor do que a sacrificada que levam, para além dela. Virgens e outros petiscos assombrosos os esperam post mortem . E quantos crimes se cometem procurando uma passagem rápida para este mundo sensacional sem sensações. Sem sensações porque sem o bem não existe o mal. Num mundo paradisíaco não há festa, nem rito, nem mito. sem rupturas persiste a morte. A vida no "céu" é, assim, a confirmação da morte.
Outros tentam, desesperadamente , sobreviver através das suas criaturas. se as criaturas têm memórias (são vidas), pode-se prolongar a vida depois da morte. Familiares, amigos, inimigos e simples conhecidos transportam-nos mesmo depois dos bichos terem começado o seu trabalho após o último suspiro. Mas estas criações efémeras depressa nos seguem no caminho sem retorno e com elas morremos outras vezes. Mais uma vez a morte nos é favorável: quantas mais vezes morrermos mais tempo persistimos vivos.
Finalmente os desafiadores da morte que através da criação artística pensam livrar-se da velha senhora. Estes crêem que as suas criações serão o garante da sobrevivência histórica. Quanto maior a criação, maior (e melhor, diria eu) será a viagem pelos labirintos da existência. Fecha-se o círculo. A arte imita a religião. O eterno encerra-se no fim. A criação e o criador, o grande criador, frente a frente nos confins da planície eterna. No vazio estéril da unicidade. No retorno (eterno) ao tempo antes da vida. No regresso ao aconchego da não existência.
A criatura autonomiza-se e rejeita o criador no momento da "ultima cinzelada". Seguem caminhos diferentes e por vezes antagonizam-se e anulam-se. A sobrevivência da criatura não transporta a imortalidade do criador. Nem mesmo quando a criatura se torna num mundo dentro do mundo e se impõe como parte da história da humanidade. O artefacto artístico, aliás, não existe em si. É apenas um feixe de sensações na psique dos que os apreciam. Uma miríade de complexos que os sentidos peneiram e revolvem até ao destino final mas não último dos vivos. Quando ouço as sinfonias da Beethoven, não reconheço nelas um velhinho surdo e triste . Quando admiro os "Girassóis" de Gog , nunca me sinto transportado à húmida e sombria juventude do seu criador, nós férteis polders dos Países Baixos, quando me envolvo nas palavras proféticas de Pessoa, não vejo um ser andrógino esgazeado pelos vapores do álcool.
Ao contrário de Camões, não entendo a arte e a glória como uma forma de libertação da morte. Penso a vida mais como um "filósofo politicamente incorrecto": " Cago na imortalidade sem corpo"!
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A carreira? | 4 | |
A vida? | 34 | |
As duas? | 22 | |
60 votes total |
Portugal é um país pequeno. Pequeno em área física. Hoje, e cada vez mais, Portugal confina-se à cidade de Lisboa. O resto do país só aparece pelo sórdido: uma ponte que cai em Entre-os-Rios, uma criança que desaparece no Algarve, um apito dourado no Porto, uma casa de regabofe pedófilo em Elvas.
Lisboa é uma cidade pequena. Todos se conhecem. Na cidade existem duas castas bem distintas. As elites, vivendo nos mesmos espaços e movendo-se nas mesmas "instalações" e os, digamos, "deserdados da sorte", vivendo nos arrabaldes da "não inscrição" e entorpecidos pelas novelas e concursos de televisão. Cada vez mais separados no espaço e no ser. Os condomínios fechados, para as elites culturais e políticas e os bairros difíceis (na verdade também fechados) para o lúmpen indiviso da multidão anónima.
Como ia dizendo, Lisboa é uma cidade pequena onde todos se conhecem. Todos os conhecidos como é óbvio porque os que não aparecem na tv não só não existem como ninguém os conhece. Sendo claro que hoje a existência não é, ela só, pressuposto de conhecimento. Ou seja, pode-se ser conhecido, e bem conhecido, sem nunca ter tido uma existência real. Basta pensar no Harry Potter ou no Sr(?) Klark Kent.
Como uma escola americana de Antropologia de meados do século XX, estudando pequenas comunidades rurais da Andaluzia, mostrou, onde os vizinhos todos pertencem a um “nós” coeso e próximo em interesses e objectivos, existe um patamar de realização para o “eu” que estes cientistas sociais entenderam apelidar de “limited good”. Se ultrapassas este tecto usaste certamente ferramentas ilícitas, do ponto de vista moral e real. Exemplifiquemos: se tens muito sucesso com mulheres, usaste filtros, pós, magias, chantagens misteriosas não correctos e inaceitáveis contrariando o livre arbítrio das conquistadas; se tens sucesso com o dinheiro, é porque traficas drogas e outros produtos afins; se falas muito e bem, só nada podes dizer. Os bens ao dispor da comunidade são finitos e o seu acesso nivelado por baixo. Se o nivelamento fosse por cima corria-se o risco da sua escassez.
Ora em Lisboa o “limited good” é imposto de forma implacável. Os ódios são mortais entre os portentosos contendores na escalada social. Utilizam-se as mais inimagináveis, criativas e mortíferas armas. Nos estreitos palcos da contenda os truques sujos são aplicados sem remorsos e de forma maquiavélica. Quando ouvimos, o que é frequente nos nossos dias, falar de cabalas, conjuras e ajustes de conta, não estamos a usar da metáfora como meio de expressão. Estamos a ouvir os relatos de uma luta intestina incessante e, muitas vezes, com um fim irreversível e dramático. A lama. A mais baixa das mais baixas castas. A lama moral de onde mais não se pode sair até ao fim dos tempos.
E, para não me alongar mais do que já estiquei neste modesto post, assim vai este lindo Portugal. Perdão esta “bem cheirosa” cidade de Lisboa.
A vida é simples. Toda a gente a anda a tornar difícil. Para além daqueles momentos de deleite que compartimos com os nossos amigos animais, pelo menos com os mais próximos, como o sexo, a alimentação, o sono, a protecção da família, ou a questão geral da sobrevivência, temos a miríade de bens que a cultura nos proporciona e que, a sermos humildes e realistas, nos podem tornar a vida prazenteira, harmoniosa e mais bela. Quem gosta dos filhos, da família, dos amigos, das pessoas ( por enquanto tudo coisas simples e baratas de conseguir), de ler, de ouvir música, de apreciar artes plásticas, de observar pássaros, de andar a pé (no campo, na cidade, na praia...), de escrever, de pintar, de tocar, de viajar, de preguiçar, etc,etc,etc , não deve ter medo de viver. Não precisa de gostar de tudo o que acima disse e de muitas outras coisas que não referi. Um eremita pode ser sereno e inteiro apenas com o seu silêncio.
Claro que é preciso saber ultrapassar (vencer?) as duras armadilhas que se estendem ao longo da vida: a doença limitativa do “ser”, a velhice e a morte. É preciso aprender a lidar com elas como integrantes da vida e não naufragar com elas. De todas elas parece-me que a velhice ainda é a mais difícil de integrar. A velhice transporta as outras duas e, nos nossos dias, está transformada num sepulcro colectivo ante mortem , escondido dos olhares misericordiosos dos transeuntes da vida.
Não se trata de ser ou deixar de ser feliz. A felicidade é uma concepção religiosa que as sociedades de consumo adoptaram para impingir coisas, e mais coisas, e mais coisas e coisa nenhuma. Um gato quando captura um rato não é feliz. Um gorila que embala um bebé não é feliz, um homem quando partilha uma refeição com os amigos não é feliz: vive sem fracturas a linha do tempo. Eterniza o efémero. Pára o fluir do tempo (ou torna-o mais lento) e sente a flutuação eufórica dos desígnios vitais. Relativiza, no caso do homem, os paradigmas brutais da cultura envolvente. Quando, e embora sendo verdade, o homem se torna o centro do Universo, a medida de todas as coisas, a vida torna-se insuportável e perigosa. O outro é sempre o outro e a compreensão da alteridade uma alegoria platónica.
O não entendimento da simplicidade da vida, com as flutuações atómicas suas constituintes, leva a alguns paradoxos da sociedade pós-moderna e isto diz respeito apenas a uma parte da humanidade, pese a tão propalada globalização que como toda a gente sabe só é global em aspectos particulares da vida humana, mas isso é uma outra história. Um desses paradoxos é o da monotonia das sociedades pós industriais onde tudo está ao alcance dos cidadãos. Onde a sociedade se está a tornar demasiado perfeita. A revolta contra este “tédio” tem levado às tão mediáticas erupções de violência-sem-sentido ” . Esta violência é sentida como a única forma de assegurar a liberdade individual. Como nos diz J.G. Ballard “numa sociedade totalmente saudável, a loucura é a única liberdade possível”. O século XXI verá multiplicarem-se estes actos de loucura em que a desumanidade parece imperar mas que não serão senão o regresso ao humano que despontou da natureza há cerca de 100 mil anos. O regresso a um paradigma perdido para reconstruir o “homem novo” anseio de todas as gerações de antanho e configuração do ser humano enquanto produtor de cultura.
A vida poderá ser simples. A humanidade nunca escolherá o caminho que pareça mais linear. E parece-me que isto tudo não irá acabar nada bem.
Todos os homens de Creta são mentirosos.
Assinado: Um homem de Creta.
Sobre o dia de João Silva, do Montijo leia o fantástico artigo de Pacheco Pereira publicado no Público. Simplesmente esmagador!
E ainda se pode colher mais informação, se se quiser completar o perfil do Sr. João, dos satélites, dos serviços de informação e da, ainda tão pouco conhecida, nanotecnologia.
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