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Levantei-me à pressa e corri a tua casa, que ficava lá para trás da minha janela. Quando cheguei, ofegante e tonto, a porta recusou-se a responder onde estavas. Não tive outro remédio senão a agressão violenta. Arrombei-a. Mesmo assim, ao ultrapassá-la, não se coibiu de me insultar. Moribunda!
Entrei no teu quarto, coração na boca, com as células asfixiadas em tabaco, e não estavas.
Sem descansar, atirei-me à rua procurando o teu odor selvático. A porta, num último esgar de vida, rasteirou-me e caí na rua pestilenta. Na lama da vida.
Ao reparar na multidão que se juntou a apreciar o incidente, reagi à velocidade do som aos insultos histéricos dos amigos da porta e fugi aos trambolhões pelas calçadas íngremes da ignorância empenhada.
Percebendo que não era seguido, abrandei o passo e aspirei o ar profundamente. Tirei um cigarro do colete (encarnado?) e fumei-o num ápice. As forças vieram-me como por milagre e redobrei a procura. Senti então o odor a lascívia, vindo do barranco da aldeia.
Corri à ponte, que unia as margens intocáveis da povoação adormecida, e espreitei, a medo, o túnel de onde emerge o discreto curso de água. O que vi não me espantou nem me confortou: servias os ingleses na posição do costume.
Esperei pacientemente sentado nas guardas do velho pontão, sem intervir.
Depois de amealhado o suficiente para as doses do dia, fomos, de mão dada, aviá-las à do Leonel.
Confortados pelo ardor violento do sangue infectado, contei-lhe o ocorrido e a pressa em contactá-la.
Tinha sonhado com outra vida, outra postura sem remendos na consciência, numa solidão repartida, e tinha tido necessidade de lhe apertar as mãos.
Ouviu sem emitir afectos ou sensações, e, no fim, só lamentou a má sorte da porta de sua casa.
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