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25 de Abril e Globalização

por vítor, em 25.04.07

Como já devem ter adivinhado os leitores deste blogue, o seu gestor e criador é um homem de esquerda. Paradoxalmente o blogue, fugindo à peia do seu dono, apresenta-se mais como anarquista e liberal. Estas divergências são aliás muito frequentes entre criador e criatura. Mas como eu ia dizendo, sem grandes ortodoxismos , o único responsável por este espaço de devaneios é um homem de esquerda. E, portanto, um admirador confesso do 25 de Abril e dos seus, múltiplos e nem sempre convergentes, ideais. Tendo sido apanhado pela revolução nos anos dourados da adolescência e vivido intensamente o PREC , é natural que os anos de festa e loucura que se seguiram lhe tenham ficado tatuados de forma profunda, imutável e, mesmo, com contornos imprecisos e mágicos.

 

Tudo isto não me impede de poder analisar, antropologicamente, a influência que a revolução de Abril teve e tem no evoluir do nosso país, tanto no campo da economia quanto no da psicologia individual e colectiva.

 

Alguns dos meus amigos de esquerda não me vão perdoar este raciocínio que vou desenvolver nas próximas linhas. Sei-o porque já o discuti com alguns deles e sem conseguir explicar os fundamentos de tal teoria. A paixão, que também é minha, pelos acontecimentos de 74/75 é de tal forma poderosa e exaltante que impede a análise serena e descomprometida. A paixão corrompe, como todos sabemos, a razão.

 

Vamos então directamente ao assunto: o 25 de Abril é  uma das principais razões para o atraso em que se encontra o nosso país nos dias que correm. Ufa, o que me custa admiti-lo. E tanto mais porque esta é uma das bandeiras da direita ressacada. Uma explicação que remete para a bondade do antigo regime e das suas potencialidades cortadas abruptamente pelos "capitães de Abril".

 

Ora a minha perspectiva é completamente diferente se bem que a conclusão não seja muito diferente... Eu amo, como já referi, o "25 de Abril e sinto-o como parte de mim mesmo. Os seus ideais são, globalmente, os que defendo apesar das diferentes cambiantes dessa panóplia ideológica e dos anos que entretanto se interpuseram. Serei, sempre, um homem de Abril. Para além disso, considero que o longo período de regime ditatorial salazarento foi outro dos responsáveis pelo atraso socio-económico do país.

 

Começo por vos contar uma hipotética história para que melhor me possam entender. Imaginemos um jovem estudante universitário absorvido intensamente pelos estudos e a caminho de uma carreira brilhante. Conhece uma bela rapariga por quem se apaixona  perdidamente. Juntos partem par uma viagem inesquecível pelo mundo e juntos vivem a mais bela aventura da sua vida. Concordarão que esta memorável experiência vai prejudicar o desenrolar dos estudos do nosso jovem universitário. Mas não vamos por isso condenar a sua aventura amorosa e, com certeza, ninguém o aconselharia a renunciar a esta transcendente viagem em troca da carreira brilhante que se lhe adivinhava.

 

O 25 de Abril foi uma aventura intensa e mágica. Os seus sonhos utópicos transportavam materiais que poderiam edificar um "mundo novo" com pessoas melhores e relações económicas mais justas e equitativas. Um mundo com mais liberdade, igualdade e mais fraterno (onde é que eu já ouvi isto?!).

Este sonho é possível realizar? Penso que sim. Mesmo sabendo que o homem pouco tem evoluído desde os tempos da Grécia Antiga, desde há 3.000 anos. Sabendo também isto as principais forças estruturantes da sociedade portuguesa e aproveitando a corrente tormentosa da globalização emergente rapidamente cavalgaram a onda e rasuraram os ideais e o espírito da revolução de Abril.

Seria inevitável? Penso que sim. Não seria possível resistir agarrado à rocha no meio de tão intensa e poderosa torrente. Então o 25 de Abril foi a jovem que desviou o estudante da carreira brilhante que o futuro lhe reservava. O 25 de Abril levou-nos para caminhos que, depois, tivemos de percorrer no sentido inverso para redescobrir os carreiros do futuro (pelo menos do futuro próximo). Este inverter do caminho do nosso encantamento, doloroso quando feito em marcha atrás, e recomeço ( com atraso, até agora, irrecuperável) constituem, a meu ver, uma das principais causas do nosso atraso actual, se bem que este atraso seja uma constante estrutural desde os longínquos tempos do rei D. João III.

 

Muita gente ficou perdida entre o caminho primordial e o real, muitos estão ainda nos atalhos do (eterno?) retorno, outros vão sendo arrastados sem sentido pela voraz  corrente dos novos tempos e, ainda outros como eu, insistindo desesperadamente em "fazer o caminho caminhando", colidindo regularmente com quem segue a corrente-sem-sentido .



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publicado às 19:25


1 comentário

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De Manuel Castelo Ramos a 26.04.2007 às 00:28

Revejo-me no que dizes, Vítor! será da idade?
Um abraço libertário.

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