Esclareçam-me! Nas últimas vezes ( poucas, muito poucas mesmo ) que me tenho deslocado à grande cidade, tenho-me deparado com um cenário deveras preocupante. Amigos meus sentados no sofá, frente à televisão e com uma mesinha (tipo para refeição de bebé ) onde, num computador portátil, navegam pela rede. Ecrã a três metros + ecrã a meio metro! Alienação total!
A amostra não é pertinente, mas é preocupante. Sobretudo a seguir ao jantar, filhos na cama ( ou ligados a outros ecrãs ), são longas horas de zapping, pixeliando pelas ondas hertzianas. ( Poças! isto é que é falari! ).
Gostaria de pensar que estas situações são excepcionais e que a regra não se assemelha, nem por sombras, a esta pequena, pequeníssima amostra. Mas tenho cá um dedinho adivinho que me diz que não é assim tão rara esta nova "forma de vida".
Eu, que vivo no campo e que quando visito os meus amigos da zona os encontro a podar as gravílias, a rachar lenha para a lareira, a apanhar favas, a jogar futeboladas com os filhos, a dormir, quando o tempo permite, nas suas camas-de-rede ou mesmo a apanhar caracóis; os encontro, pela noite, a ler junto à lareira ( no Inverno ) e a conviver com os amigos nos alpendres nas cálidas noites de Verão algarvias, espanto-me e entristeço-me com estas tendências urbanas emergentes. Já não bastava a alienação* da maior parte dos trabalhos (empregos?) que para não se beliscar a auto-estima, se propagandeiam interessantíssimos, mas que vendo bem, são inúteis e dolorosos?
Anos de vida ligados a ecrâs no trabalho e na alegre casinha. Anos e anos de vida passados nos esconsos interiores de automóveis e transportes públicos aspergindo fumarolas mortais na atmosfera cinzenta e envenenada.
"Estranha forma de vida" num espaço onde há de tudo. Onde a a oferta é tão variada que bloqueia a capacidade de escolha da maioria dos mortais. Excesso de informação difícil de manipular e processar que se revela letal para a vida.
Continuando a aspar partes de letras de canções, posso apenas aconselhar a que se vê enredado nesta teia de constrangimentos e incertezas: " muda de vida"!
* Alienação. Repitam devagar soletrando: a-li-e-na-ção! Velha palavra vilipendiada pela história recente e ausente da pena dos escribas modernos, mas que sulca o corpo deixando-o em carne viva. Voltaremos a vê-la a adornar os textos e não será tão serôdia a sua ressurreição. Obscurum per obscurius!