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Escrever é...

por vítor, em 15.03.23
Escrever é…
Escrever é dor de parto sem grito.
Escrever seria romper a sombra, se a espessura desta o permitisse.
- Enviaste
(…)1
Escrever é este ardor de lâmina que sentimos quando se apaga a memória.
- Enviaste
Escrever é desistir a meio do caminho.
- Enviaste
Calo-me já.
- Enviaste
(…)2
Qual delas?
(…)3
É que tenho muitas vozes. Só isso.
- Enviaste
(…)4
Notas:
1 – Aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii
2 - Deixa ouvir a tua voz 😃
Obrigado
3 - A voz?
Desculpa, não percebi.
4 - Eu sei!
😎
Faro/Tavira, 6-12-2022

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publicado às 16:02

ombro algum

por vítor, em 15.03.23

Nunca conseguirei chorar em ombro algum. Parto e uma parte de mim fica. Resiste.

Eu mesmo plantei a flor que dei

no dia em que resolvi partir, iniciar a caminhada para esquecer. Sei que nesse caminho procurarei a distância que me poderá trazer o esquecimento, uma jornada tão longa quanto possível. De bermas envenenadas por palavras cruéis e falsas, por margens lamacentas onde crescem sacerdotisas profanas. Não sei se o sabor das ervas mastigadas, o odor intenso da daninha fragrância, é o que se desprende da pele, se o vazio que, sobressaltado, transporto . Se as sombras que me ocultam o caminho serão obstáculos insanos que a tristeza impõe, se balizas que me conduzem ao longo estertor da ausência. Seguirei, no entanto, sem olhar o que para trás ficou, levando apenas as minhas lágrimas de alegria. O antes não perturbará o que hoje conduz ao amanhã: o futuro não existe sem as inquietações de quem amanhece no princípio dos tempos, nem acorda sem esfregar os olhos como se tudo fosse como era antes de ter acontecido. Tudo renovado como se aprendêssemos a renegar a garantia do retorno. Do regresso ao que já não existe: mesmo que o queiras, que nós o queiramos, nada se mantém como era! Da manutenção do eterno emerge a potência que gera a mudança, que varre o passado e faz emergir, na onda imparável, medonha e terna, o coração que carrega a dor de se querer inerte. Riem as magnólias nas ruas desertas. O ser que erra envolto em luares sombrios derrama pelas calçadas húmidas o clamor dos peregrinos perplexos, o clamor dos maestros insolventes. Vou para além dos pensamentos antigos, onde delírios se decompoem em silencioso pulsar de desprezo. Onde a última vez foi um casamento entre opostos divinos. Não chovera nos primeiros alvores dos dias infelizes. Nunca conseguirei chorar mais do que o sacrifício dos meus dedos cansados. Os rios morrem, e, por isso mesmo, as dores dos que mortos transportas e vivos permanecem são vozes mais rebeldes do que as de vagabundos à procura de poetas da verdade, poetas exibindo a sapiência da tragédia, renegando o poder de convocar as resistências da maldade.

Um dia voltarei ao lugar que nos prende e arremessa no precipício da noite virginal.



Cativa, 19 de dezembro de 2022

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publicado às 15:58

A Viagem e os Criadores

por vítor, em 15.03.23

 



Sempre senti o apelo da viagem,

e, no entanto, apesar das voltas que fui dando, nunca saí deste lugar morno e acolhedor. Lugar centrado em mim e que de mim faz mundo. Sim, a verdade, se é que podemos falar assim, é que todos seremos esquecidos. Mesmo os que, bem aventurados, deixaram "obras valerosas". O que restará, se restar, será uma caricatura do que fomos, tão distante, muitas vezes, que nós próprios não nos reconheceríamos nela. Porque aquilo que os outros fazem das coisas é obra sua. Tornamo-nos nos outros, manipulados por gerações com formas de interpretar diversas daquelas que nos enformaram e levaram a ter comportamentos e ideias, a criar, que deixámos como rasto de vida. Pegadas que o tempo apagou: restam apenas retratos a sépia crónica. Ninguém nos reconheceria se voltássemos um dia ao convívio dos outros que nos sucedem. A criatura é sempre mais duradora que o criador. O próprio criador se transforma em criatura quando olhado de fora enquanto produtor de inovação. As criaturas universais tornam-se obras de construção universal. Obras coletivas que anulam o artista. Ou melhor, integram-no naquilo que o fez capaz de criar a coisa cultural: os arquétipos profundos criadores da humanidade. Aquando da gestação, a criatura está geneticamente condenada à condução guiada do escopo do criador. Guiada pelos genes e pelos, intrometidos, arquétipos. Uns, inscritos no ADN, que individualizam, outros, tatuados na psique, que universalizam e destroem a concepção de autoria.

Não, não há fuga à gadanha final. A morte sempre vence.

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publicado às 15:56

Saberão os loucos que estão loucos?

por vítor, em 15.03.23
É comum pensar-se de que quando não se gosta de um coisa, ela não presta. Vou ali e já venho. Se não voltar é porque não tenho tempo para o anunciar. O capitalismo levará à destruição da humanidade. Ao fim do mundo. Quando eu voltar, talvez nem seja precisa a revolução.

Ora aí está a grande questão. A questão!: saberão os loucos que estão loucos? Como todas as perguntas fundamentais, não tem respostas.

A criação deveria ser como os sonhos: algo elaborado por nós, cozinhado dentro de nós, carregado de passado, de presente e, até, de futuro, novo, único, incontrolável e fugidio, assustador e nevoento.

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publicado às 15:53

La mort de mamam

por vítor, em 15.03.23

je suis très triste , je pense a vous souvent , plus encore aujourd'hui car une part de mon coeur est brisé.

Luís de Brito

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publicado às 15:51

Os dias prosseguem outros dias

por vítor, em 15.03.23

 



No café, quis pedir um rissol, mas como não me lembrava do nome do raio do frito, acabei por pedir apenas uma cerveja. Não era que não pudesse levantar-me e apontar o rissol, que raio de nome para uma coisa que se parece é com uma lua, mas não me apeteceu. O empregado deveria achar, toda a gente acha sempre alguma coisa, e raramente acerta no que acha, as ações têm sempre tantas interpretações que nem o ator sabe, muitas vezes, o que o levou a fazer aquilo que acabou de fazer , que estava com alzheimer. Quem faz, fez, e, ele próprio, acha que o fez por alguma razão qualquer que se se for bem a ver não tinha nenhuma razão para fazer.

Quando deixei o café, deitei os olhos a uma banca de rua que me pareceu de livros. Livros e ferramentas para a agricultura chamam-me sempre a atenção. Mal tinha posto os referidos olhos no tampo da mesa, um sujeito, o dono do estendal, perguntou-me se queria assinar um requerimento seu para ser candidato à presidência da República. Disse-lhe logo que sim. Lá estão as tais ações irracionais. Curiosamente, o homem não pertencia a partido nenhum. Lá assinei os papéis todos, e ainda tive que ir à carteira, para preencher a data de validade do cartão de cidadão. Já ia ao fundo da rua, quando, de repente, voltei para trás a perguntar ao candidato ao mais alto cargo da nação como se chamava. O mais provável é o homem não ganhar as eleições. Se calhar nem consegue as assinaturas necessárias para tal desiderato. Mas nunca se sabe. O investimento não foi muito grande e os ganhos poderiam ser consideráveis. Afinal, a razão ainda tem a sua importância.

Ainda não me tinha bem libertado da condição de homem cívico, cidadão interventivo na vida democrática do seu país, e já estava metido noutra. Quando passava, fugazmente, e por mero acaso, em frente ao Hospital Central, um homem com mau aspeto, numa cadeira de rodas, chamou-me. Eras, logo, de cerneira, tratamento por tu, capaz de me empurrar até ao quiosque da rotunda para comprar tabaco. Ainda não tivera tempo para responder, e já íamos a caminho da rotunda, que ficava ao fundo da rua, a uns 500 metros do hospital. Conduzir uma cadeira de rodas na cidade não é pera doce. Obstáculos de toda a ordem vão surgindo, e, às vezes, de onde menos se espera. Passeios altos sem rampa, carros e trotinetas em cima dos passeios, até os transeuntes parecem querer dificultar a progressão de quem se desloca numa cadeira de rodas. Talvez pelo aspeto do passageiro. E, que a verdade tem que ser dita, do condutor. Os dois com uma barba bíblica. Embora este último, no caso, eu, relativamente bem vestido e bem nutrido, o primeiro, o prominente transportado, mal vestido, e, manifestamente, mal alimentado. As rugas da parte da face visível eram canyons profundos desaparecendo na farta pilosidade. Muitas pessoas que nos encontravam saudavam o indigente. À distância. À volta, quando o empurrava até à porta do hospital, onde estava internado, e donde se tinha escapado, sem autorização, para ir comprar tabaco, contou-me que era muito conhecido em S. Brás e Faro. Por bandidagem e ladroagem. Já tinha trocado balas com a polícia, mostrou-me as cicatrizes na barriga das que lhe tinham acertado, e passado uns anos na cadeia. Quando o deixei no local pretendido, ainda me pediu cinco euros. Menti-lhe, respondendo que não tinha. Não levou a mal. Despedimo-nos combinando encontrarmo-nos em S. Brás num dia qualquer.

Como já era tarde regressei a casa de táxi, gastando os dez euros que tinha na carteira. Se tivesse sido generoso, teria regressado a pé. As mentiras, às vezes, dão um jeito do caraças.



11.1.2023

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publicado às 15:49

Eia, vedes!

por vítor, em 15.03.23
Eia, vedes?

Vedes o que a distância esconde? Vedes? O melhor do mundo está por debaixo das sombras sobrepostas que as memórias aspergem no silêncio dos dias. Não te confortes com a solidão dos outros. Eia!, e não te envergonhes de ser quem não és.

Só o que ontem aconteceu fará de nós, de todos nós, uma assombração no caudal fecundo das águas da solidão. Nas almas que vão, levadas na enxurrada, poderás observar os rostos que as sombras ocultam. Aí, onde os abutres esperam a passagem dos cadáveres ainda quentes, verás, sem espanto, atravessar, em frente do cais que ocupas, aquele que foste antes de seres. Aquele que te acena mesmo depois de morto e que te convida à viagem. A estrada está escancarada para os que não obedecem ao devir. Vai e não voltes nunca a tua face para trás, no cais de onde partires está um homem que grita a quem passa. Já não és tu, nem tu és o que vai com os olhos postos no além.

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publicado às 15:49

...

por vítor, em 15.03.23
(...)Criador e criatura numa dança sem fim rodopiando convulsivamente ao som de uma música gravada a fogo na memória coletiva da humanidade.

Tudo o que fazes se liberta do que fomos. A autoria é sempre uma obra coletiva sem autor.(...)

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publicado às 15:48

Da inimputabilidade da arte

por vítor, em 15.03.23

 



Quem é o autor? O humano que cria? Ou queria? Que espaço podemos isolar entre o criado, a criação, e o querer de quem cria? Pouco! E, quase sempre, a autoria do criador é involuntária, resultando, apenas, da impossibilidade da réplica: nada é igual a nada. Só o mundo cibernético permite a omissão da idiossincrasia. E, mesmo assim, quando tentamos materializar o digital, sai o analógico único e imperativo. A autoria surge pois da impossibilidade da réplica. E, como sempre, escapa à vontade do autor. A criação, sendo, portanto, obra do criador, foge à sua vontade e assenta em pressupostos genéticos, arquétipos e condicionalismos socio-culturais inconscientes e impalpáveis. Sendo a humanidade portadora desses programas genéticos e culturais de forma inelutável e vital, qualquer ser humano será, potencialmente um criador. Um artista. Serão, ainda, estas

tatuagens, filo e ontogenéticas, que responderão pela emergência da criação. Criador e criação numa dança sem fim rodopiando convulsivamente ao som de uma música gravada a fogo na memória coletiva da humanidade. A lassidão das peias deterministas que enformam loucos e dementes faz destes os potenciais inovadores mais fecundos de entre os criadores. As obras de ponta são o resultado, cruel e vazio, de mergulhos, em apneia, de pescadores inconscientes no profundo e vasto inconsciente. Pescadores sem rede de pérolas inúteis.

Tudo o que fazes se liberta do que somos. A autoria é sempre uma obra coletiva sem autor. Inimputável.

29.1.2023

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publicado às 15:44

uma certa e estranha luz

por vítor, em 15.03.23
Há uma certa e estranha luz que incide nos corpos nos finais do inverno e impõe neles uma dor antiga, vinda do fim dos tempos, que ninguém consegue explicar. Depois, quando os dias crescem e as noites deixam de assustar os pássaros, e as flores rebentam as cápsulas prenhes, soltam-se as vestes e os jovens riem sem conhecer o porvir. Nessa nova claridade dos dias maiores, os velhos viajam como se o passado fosse uma terra prometida.

As sombras não calam as vozes que iluminam as vidas de quem amanhece todos os dias. É um engano meu amigo. A aurora é um resgate impossível do nada. Dançamos como pedras antigas. Somos o rodopio do vento burilando o tempo.

Tavira, 2 de fevereiro de 2023

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publicado às 15:43

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