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A Vetusta Cobertura

por vítor, em 26.12.18


Como vaga de um mar sem fim, a mortalha do poeta cobriu de espanto o pântano das cidades sobrenaturais, e o sangue do cadáver tatuou a vetusta cobertura, revelando o sudário sagrado, o santo sudário ardendo na orla do deserto, escorrendo da lâmina que desenha a silente cumeada do abismo, labirinto onde as hienas desesperam para lamber o desenho morno das palavras, as facas reluzem nas sombras inúteis da tempestade, onde as multidões se atropelam em outlets negociando, a preços de saldo, amor e amizade. Agarro o pano aconchegante da morte e arrasto-o até ao peito, sinto frio nos pés, encolho-me como um político mal nutrido, vagabundo na podridão das insinuantes serpentes, e lanço o olhar através da memória superficial dos outros: a visão que me assombra vem, venenosa e nevoenta, refazer a realidade e mostrar às pedras que me conduzem a caminhada, a linha da vida que traçarás na erva curta que te servirá de alimento e leito. A partir de agora, não desejarás o que te não pertence, não mais poderás atingir a eternidade que a morte contém e guarda. Há de o vento soprar com violência e os sonhos cristalizar no medo. Nascerão, depois de tudo o que conheceste, crianças todos os dias.
Vn Famalicão, 24/12/2018

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publicado às 14:16

Destroços

por vítor, em 20.12.18

 

 

Destroços

E porque as festas estão por todo o lado. E porque ninguém consegue fugir do tempo. Uma boa sugestão para "a passagem das horas". Suas e dos seus. Não é um obra nova, mas é uma nova obra. Tinha sido publicada digitalmente num projeto muito interessante, escritores on-line, que não sei o que lhe aconteceu, e, por isso, publiquei-a aqui. Recebe-se, em papel, em casa.
Devolve-se o pecúlio dispendido se a obra não convencer...

 

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publicado às 18:24

Camaleão Acinzentado

por vítor, em 13.12.18

Já não era sábado, mas também ainda não era domingo. A hora mudara agora mesmo, como sempre acontece quando a estação das carraças se inicia.

Isto perturbava o camaleão acinzentado como noite incompleta:não as carraças, que não lhe interessavam para nada, não lhes apreciava o sabor acre, nem a crocante quitina, e não tinha problemas com a sua agressividade doentia. E a amabilidade era-lhes, aliás, correspondida: não as atraía o sangue frio e a pele viscosa.

O que o preocupava, realmente, era a imprecisão do tempo. Se a noite avançava como sempre. Se a liquidez do devir se transmutasse na ciclicidade prescrita. Se a noite, inexorável, regia o sono merecido dos que, como ele, usavam os dias para manter os corpos e garantir o futuro.

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publicado às 16:17

O Que Não Precisas

por vítor, em 13.12.18

Procura sem a ânsia

de seres grande, procura sem cessar

o que não entendes.

O que não precisas. As sementes dos santos.

Levanta-te ao encontro da solidão honesta

e vã, desenha em ti a podridão do novo

como como se tudo emergisse

das ideias confusas da singularidade,

dos caminhos já trilhados

por outros, da cegueira obscena

e sôfrega de sangue virginal.

O que encontramos são murmúrios

só entendíveis a iniciados nas longas

procissões de vagabundos

à procura

das areias escaldantes, da nauseabunda e escarlate

mãe de todas as dores. As dores que apoquentam os mortos.

Murmúrios conspirativos renegando o passado

perdido atrás de paredes transparentes,

o oculto transgressor rompendo

o discurso básico dos profetas. Enigma

de antanho onde a memória

emerge dos pés mergulhados em cerimónias

do esquecimento, escaldantes, brasas rasgando as vestes

dos risos alarves, xamânicos, onde os rostos

de cadáveres orgulhosos são possuídos

pelo medo convulso das tardes. Procura os que te

arrastam até ao fim das sombras do desejo.

 

Monte Gordo, 3-11-2016

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publicado às 16:15

Se o ódio se adianta

por vítor, em 13.12.18

se o ódio se adianta

e te prescreve a dor,

doma-o e sai para a rua,

grita como se o labirinto

que as flores desenham

no torso da nuvens

se rasgasse

em cicatrizes invisíveis

ao sentido dos duendes imorais,

grita até sentires

o eco das paredes

te atirarem no precipício

da carne a latejar de desejo

se o ódio persistir, enraivecido,

regendo os medos e as sombras,

sai do teu corpo e abandona

o odor crepuscular,

o rumor brando das entranhas,

deixa-te levar por entre as casas

do lugar, por entre a claridade

que atravessa os dias

tatuados nos sonhos incandescentes

do profeta desconhecido

estranhos tempos estão encantando

o coração das cidades, as guelras dos peixes

emergindo das redes sociais,

saudando o ódio que nos enforma

e conduz, as esculturas de lixo

rasgando a pele de animais degolados

ao entardecer, sangrando palavras

 

vrsa, 21-o3-17

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publicado às 16:12

o resto da tua vida

por vítor, em 03.12.18

Se dormisses como dormias antes de ter atravessado o rio que dividia a tua juventude do resto da tua vida, serias capaz de entender os sonhos que agora se recusam em aparecer nas sombras da noite. O que quer que fosse, não te traria a juventude de volta.

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publicado às 09:41


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