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Lutando contra os elementos. Andrajoso mas sempre em pé....
Como estás mudada, disse-me o vizinho enquanto se regalava com a visão ímpia do meu umbigo.
Rastejei na planície do fogo, atropelando as respostas que a denúncia do peixe anunciavam, interpelando de chofre o cão sem pulgas internado há séculos no manicómio dos gritos impossíveis.
Onde estavas quando precisei de ti, quando o vento soprou do quadrante das sensações inúteis?
O vizinho voltou à carga:
- Como te sentes antes de entrar no corredor sombrio que leva ao coração?
Fiz-me desentendida e tricotei, compulsivamente, uma camisola de lã de minotauro. Senti-me lâmina rasgando a noite, poeta partilhando o sangue corrompido, fábrica de invernos indisponíveis.
Não encontrei ninguém que gritasse a tristeza das palavras cruxificadas em páginas amarelecidas, ninguém que se mostrasse triste com a ausência honesta e fria das catacumbas. Deixo-me ficar no porto à espera de um navio fantasma. Era o dia das oito espadas cindirem o que restava do país lamacento, das cobras, o dia da emergência do mal, dos desejos iniciais.
Quando o primeiro navio se aproximou do cais onde adormeci exausta, um peixe, vindo do fundo das trevas do abismo, de cabeleira ensanguentada, escorrendo pus viral, assomou à tona das águas e disse-me olá.
Acordei estremunhada e sorri. Quando regressou às profundezas do mar azul, pareceu-me ver nele o meu vizinho acenando à castidade efémera do desejo.
M. Gordo 10/11/13
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