Deixo-vos aqui as palavras que ombreiam a antecâmara da maior das solidões que podem submergir uma criatura. As portas do inferno. A minha descida ao mundo apocalíptico do romance. Se acaso conseguir encontrar o caminho de saída desta escur
...idão labiríntica, darei notícias. Se não...não.
A noite cai do silêncio das árvores. A luz, que se retira, incendeia o céu para os lados da cidade. Agora a solidão é maior. Maior mesmo que a noite que se avizinha. Que as noites que virão. Os passos que invadem o crepúsculo crescente dirigem-se ao encontro do nada. Onde a máscara rege o destino das ilusões compreensíveis. Diante do silêncio das árvores. Os passos de um homem aproximando-se de si próprio. Um homem atravessando a noite inicial, contornado a inquietude seráfica do real.
Nada do que transporta na memória lhe interessa. A vida resume-se à noite que anuncia o recomeço do tempo que se repete. Caminha, porque caminha, como um cão vadio, sem destino, reprimindo o desejo de voltar atrás. Aonde, sabe, imprimiu as pegadas na poeira incontornável. Na vida que também pertence aos outros. É, agora, uma imagem fossilizada que o futuro e o cansaço restituirão ao nada.
Mais uma noite inscrita na recomposição das palavras vazias, inúteis, no preenchimento das horas que antecedem a madrugada. Será assim porque será assim. Repetindo o ritual incontinente anunciado nas entrelinhas que o antanho teceu. O sacrifício é como lama à beira do precipício. Nela banharás os teus restos até ao fim dos dias. Não cairás na obscuridade do vazio infinito. Não tornarás ao chão seco da arbitrariedade.
Beberás as mesmas cervejas, soltarás as mesmas palavras, encontrarás as mesmas falas, os mesmos companheiros na tristeza envolvente; até o pensamento se confundir com a escuridão da noite.
Quando os pássaros se levantam no céu em labaredas, voltas a casa. Ao sono convulso e breve. Até à noite que se anuncia, que virá depois da luz, mergulhas no deserto branco, na imensidão vazia da página oculta onde estampas os sinais vitais que te restam. Rasgar o suporte das palavras, comportaria a libertação a que anseias. É este o dilema que te dilacera a carne. Escrever ou não escrever. Se não escrevo, morro; se escrevo, não vivo.
Sem deixar marcas na poeira da madrugada irrepetível, voltas a casa. Na Côncaba que acorda sem destino.