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às vezes aparecem na cidade
figuras recortadas na paisagem brusca
retirando da luz a sombra que cresce
na calçada pardacenta
um homem senta-se numa cadeira
azul e o vento fustiga-lhe o rosto
(quantas vezes já o dissera) imaterial
são três horas na tarde e o crepúsculo
assoma-se por detrás da noite
uma mulher, que o sopro da ventania
não incomoda, observa o que as horas
aspergem no desassossego dos sentimentos
criptados, na voragem das palavras cruéis
atravessando a calmaria que a envolve
aproxima-se da cadeira azul enquanto
o relógio da torre açoita o ar diverso
debruça-se, suavemente, sobre a cadeira
e beija o cabelo revolto do homem sentado
o relógio repete a linguagem do tempo
três vezes na cidade engolida pela sombra
as árvores despem-se para enfrentar o frio
o beijo atira o homem até aos confins de si mesmo,
até onde a solidão desaparece e o mar morno
contorna o emergir das palavras
a mulher reergue-se do beijo
e desloca-se imparável para o fim da rua
onde a espera a eternidade
a noite cobriu de trevas a cidade
e o homem renasce na esplanada
de cadeiras azuis, bebendo cerveja
com figuras que convergem no
esquecimento da dor
o caminho divergente acontece
quando as rédeas do afecto
não resistem ao que materializa a solidão
contra a tempestade ergues a dor.
MG 20/12/2010
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