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Ontem, atravessei o país a mais de 160 à hora para chegar a tempo de me sentar a ver O Glorioso. Cheguei a tempo de assistir em directo à grande desilusão. Acontece aos melhores. A culpa, há sempre alguém para a transportar, é só do Jesus. O David é dos melhores defesas centrais do mundo mas a defesa direito é apenas um jogador mediano. Ainda por cima, anunciou-o muito antes do início do jogo. Os ingleses atacaram sempre pela faixa esquerda e desorientaram a defesa completamente. O Di Maria não sabia por que equipa estava a jogar; o Tacuara, agora que aprendeu a parar as bolas com o queixo, parecia "um tractor a pedal"(1). Bom, deixemos de coisas tristes, que certamente dias de júbilo aí virão, e falemos de dias normais. Cheguei do Norte ontem e hoje lá fui à esplanada do Veneza tomar café, ler o jornal e apanhar sol. Mal me tinha sentado, chegou o meu amigo Rui ( e outro amigo, que vou ostracizar, que só me cantava o Yesterday) às voltas na cidade a tratar de problemas com o fisco relacionados com a comercialização dos seus livros. Deu-me o último poema que tinha escrito e cá está ele de tão fresco que ainda cheira a tinta ...de choco. É o seu poema mais autobiográfico que conheço.
(1) Como lhe chama esse insigne crente, Filipe Nunes Vicente (FNV).
AINDA NÃO TINHA CHEGADO
Ainda não tinha chegado perto do equilíbrio
o seu acordo ortográfico era um vizinho no
estrangeiro
contudo tinha tangerinas
a balouçar nos dedos
círculos de polén no espelho
das vontades.
Trazia a uma perna um cão
desamarrado
um camaleão na árvore do seu lugar.
Despedia os domésticos medos cuspindo
bolas transparentes de sabão azul.
Era uma criança com quase 50 anos
já tinha comido mais de metade dos sorvetes.
Ainda não tinha chegado a lugar nenhum
(que quererá isto dizer?)
às vezes tinha vontade de ir à praia
apanhar conchas e ventos para
brincar com o mar.
Era um cigano que escrevia.
Olhava o cu das moças nos dias de
Sol
tinha uma deusa escondida na garganta.
Corria de barco de ilha
em ilha de duna em duna
procurando aquilo que os outros
apelidam de felicidade.
Ainda não tinha chegado.
Rui Dias Simão
PS:Quando vinha da esplanada para casa, soube que morreu o Faria. É um amigo longínquo, mas um amigo. Paz às suas almas.
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