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Hoje à noite. 33 graus numa noite sem vento, numa das mais bonitas praças da cidade de Tavira, o largo do Convento do Carmo, espetáculo de música (tocada ao vivo) e teatro aéreo pelos argentinos Puja.
Fantástico!!!!
O Verão continua. Depois da tempestade de ontem com a derrota dO Inominável, que me fez estar acordado até ás 4 da manhã ( o que vale é que dei um avanço enorme no livro do Loução sobre Templários e esoterismos), hoje, um dia perfeito.
De manhã, café e leitura do jornal no Chá Com Água Salgada, na praia da Manta Rota. Mar à vista. Passeio pela praia e almoço comprado em Cacela - febras com batatas fritas e arroz - para alegria do filhote e descanso do pessoal maior.
De tarde, rega das árvores mais stressadas da secura, café em Cabanas, à beira da serena Ria Formosa, visita à mãe e, novamente, rega. Em Cabanas encontro feliz com um velho amigo da aldeia, que não via há muito. O meu filho comentou a estranheza, dele, é claro, em relação ao meu amigo e à família. Bem diferente de nós. Nós todos turista pé descalço, eles todos domingueiros. Expliquei-lhe que aquele amigo querido tinha perdido o pai quando tinha dez anos e que tinha deixado a escola para trabalhar para a família. Ele, a mãe e uma irmã bebé. O pai tinha 40 anos. Ainda me lembro, com se fosse agora, dele a pontapear as pedras da nossa rua com a raiva da perda do pai. Trabalhou nas obras até casar. Depois, como o sogro tinha um barco, na dura labuta da pesca, até hoje. Até casar, andou sempre comigo e com os amigos de sempre, que estudaram até tarde. Gostava muito de aprender e pedia-nos os livros que deixávamos de precisar à medida que íamos passando de ano. Sobretudo os de Geografia. Depois de casar, deixou a aldeia e foi morar para Vila Real. Passámo-nos a ver pouco. Os outros 4 amigos também seguiram os seus caminhos mas foram-se sempre encontrando, até porque 3 vivem perto. Quando o 4º desce de Lisboa, onde vive, os encontros são memoráveis. Paralelamente às profissões do dia a dia, ligaram-se ao ao teatro, à música, à escrita e às artes plásticas e o amigo pescador foi ficando nos recantos quase inacessíveis da memória. Nas tais noitadas de arromba, sempre nos lembramos dele e combinamos que para a próxima teremos que o contactar. Nunca aconteceu. Hoje trocámos de números de telemóvel e... para a próxima é que vai ser. Foi muito bom tê-lo encontrado. A seguir, visita à mãe e degustação dos tradicionais doces de figo e amêndoa do dia de todos-os-santos. Quando era menino detestava-os. Agora adoro-os. Estrelas de figo com amêndoas nas ponta e figos cheios são os meus favoritos. Regresso à Quinta e recomeço da rega. Enquanto as laranjeiras, noutro lado, bebiam a água da rega gota-a-gota, eu regava, de rojo, as tangerineiras e outras árvores de fruto. De rojo a água, não eu. Este sistema de rega tradicional consiste em levar a água por um rego (um pequeno rio) até às árvores sedentas e alagar uma caldeira à volta do pé. Depois passar para outra árvore e assim sucessivamente. Vi, no pátio das laranjeiras da Mesquita de Córdova, um sistema muito parecido a este, certamente uma técnica trazida pelos árabes para a Península. Este método de rega é extraordinário: rega com eficácia e permite ao trabalhador um trabalho lento, metódico e sempre em contacto com a água. O único problema é a lentidão da rega: regar uma laranjeira leva 5 minutos e sempre com a supervisão do trabalhador. 100 árvores são 500 minutos. Mais de 8 horas. Com a gota-a -gota regam-se 100, 200, 1000 em hora e meia e ainda por cima sem ser necessário trabalhador algum.Por isso as que rego de rojo são apenas cerca de 30. Para reflectir não há melhor. Uma auto-psiquiatria inqualificável. Depois, atira-me para o passado, longínquo e mais recente: longínquo quando toda a quinta era regada assim e eu, criança, brincava com barquinhos nos "rios" que o meu avô guiava até às muitas centenas de laranjeiras; num passado mais recente, quando os meus filhos brincavam nos meus "rios". Agora só o meu cão Matrix e a minha gata Beti por lá aparecem a fazer companhia. Enquanto esperava que cada caldeira enchesse e antes de, com uma enxada ensinada, fechar uma "porta" e abrir a próxima, ia comendo romãs que apanhava nas vizinhas romanzeiras.
Finalmente, um cigarrito enquanto o Sol se punha por detrás do Cerro de S.Miguel. Um dia perfeito. Pelo põr-do-Sol, parece-me que o Verão se vai amanhã embora. Oxalá, estou à espera da chuva há muito.
(enquanto escrevia este atabalhuado texto, passámos para o outro dia. O dia perfeito já não é o de hoje...)
Foto gentilmente surripiada a Claudia F.
Em Agosto o Algarve torna-se complicado. Não para que os que nos visitam pois esses são os responsáveis pela complicação de que vos falo. São "os agostinhos" epíteto que um meu amigo olhanense lhes aplica porque convergem todos a esta maravilhosa terra em Agosto. Aliás o que acontece em todos os Agostos em todas as terras turísticas do mundo.
Vais comprar o jornal, já acabou. Vais meter o euromilhões, está uma bicha até à rua do fundo. Vais tomar um café, não tens mesa. Vais ao restaurante, esperas 2 horas pela mesa, duas pelo empregado, duas pelo conduto e duas horas pela conta. E tudo aos repelões, com caras de caso e com os agostinhos a refilar e amuados com a confusão que eles próprios criam.
Hoje para fugir a este estado das coisas fui dar uma voltinha na minha velha Honda. Barrocal e Serra (até para ver como é que isto vai de incêndios), tudo fantástico como sempre. Santa Rita, terra da minha mãe Rita, serena e acolhedora (uma construçãozita aqui e ali esquisitam mas aceita-se). Quando me ia deitar na curva para a Quinta da Cativa um pensamento mau (normalmente bom) invadiu-me a cachimónia: um cigarrinho na Fábrica. Ria e mar com Cacela-a-Velha a espreitar lá do alto. Este, habitualmente bom - pese embora os malefícios do tabaco -, espreitar da ria, constitui um dos melhores divãs para a minha frágil e convulsa mente.
Quando cheguei ao cruzamento, na estrada que leva do Ribeiro do Álamo e Cacela-a-Velha, já os automóveis tomavam conta das duas margens do alcatrão. Quando entrei na estrada da Fábrica, a loucura já era assinalável: carros dos dois lados da estreita via quase impediam a passagem de um carro, os cruzamentos eram manobras dignas dos melhores pilotos de moto trial. Dentro da localidade a loucura era total: nós de tal forma complexos impediam a maior parte dos carros de prosseguir o caminho que os seus ocupantes tinham delineado. À primeira vista pareceu-me que só pelo ar ou pelo mar. Com a minha velha e dedicada mota, lá fui furando como pude entre aquela amálgama de lata e plástico e pus-me dali pra fora rapidamente e doente com a alucinante experiência vivida.
Como é possível que tanta gente se sujeite a tanta dor para ir e vir "descontrair" até à praia. A praia da Fábrica, garanto-vos é uma coisa do outro mundo. Mas o querer não pode constituir nunca a morte do querido e do ...querendo.
Momento alto na Quinta. O Solstício de Verão.Ceifa, debulha, enfardamento. E o mais importante de tudo: a renovação do restolho por onde arrasto os pés cansados e a mente convulsa.
O Verão no Algarve começa em meados de Maio. Este ano veio mais tarde. Depois de um Maio frio e chuvoso, só hoje fez a sua aparição nestas paragens do Sotavento. Chegou sem se anunciar e no esplendor da sua força: 34 graus à sombra pelas 15 horas. Eu que gosto de todas as estações recebi-o com entusiasmo. Só que... tinha já decidido acabar com os matagais e as ervas secas em zonas da quinta que podem constituir um perigo em caso de incêndio.
Faz agora quatro anos que tive que evacuar a família no intervalo do Portugal-Holanda do euro 2004, quando o fogo desceu da serra quase chegando ao mar. Eu resisti até ao nascer do dia empapando as terras à volta de casa. Felizmente o fogo manteve-se respeitosamente afastado e não chegou à casa. Nesse ano a Serra algarvia ardeu durante todo o escaldante Verão. Depois desse susto não posso descuidar-me.
A seguir a um almoço frugal de rabanetes, tomates e cebola apanhados na horta, misturadas a uma lata de atum, meti mãos à obra. Montei o meu velho Deutz, D 4006, de 1970 e penteei a terra enquanto o Sol escaldava. Quando passava por debaixo de uma oliveira, um ramo atrevido riscou-me um sulco de sangue no pescoço, do couro cabeludo até às costas. A compensação foi que andava com umas dores na coluna há umas semanas que, com os saltos e os solavanco da máquina, desapareceram completamente. Massagens gratuitas e eficazes...
Ao fim da tarde deliciei-me com um magnum de amêndoa numa esplanada com as serenas águas da Ria Formosa a meus pés. Uma tarde espantosa antes da invasão que não tarda.
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