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De onde vens, se o outono passou e não podes mais brincar aos meninos? O tempo foge-nos quando tentamos abraçá-lo e entendê-lo. Como Santo Agostinho, sei o que é o tempo mas ao tentar explicá-lo, foge-me por entre os dedos como areia. Ainda ontem, corria pela praia como se não houvesse futuro. O vento fazendo ondular os cabelos que se derramavam até às costas. Os meus pais queriam que fosse menina. A primeira fotografia tirada nos Estúdios de Fotografia Andrade, junto ao mercado das verduras, mostra-me de vestidinho branco com um longo cabelo negro atado por cima da cabeça. Um totó, parece-me. Já me sentava sozinho, e por isso já devo ter um ano. Era mais eu que eu.
Depois, depois tornei-me num rapazinho solitário que gostava de chuva. Quando o cheiro da terra aspergia o ar às primeiras chuvadas do outono, gostava de passear descalço recebendo as quentes e grossas pingas no rosto. Coitado. Faz tanta pena, diziam em surdina os aldeãos com sinceridade. Ninguém deseja mal a uma criança. A minha mãe não queria saber de excentricidades. Muito menos no seio da família. A vassoura trabalhava em funções estranhas ao seu destino. Nada me demovia. A chuva que me escorria pelo corpo era a euforia que me faltava para as outras coisas que, supostamente, deviam ser do interesse das crianças. Cresci à chuva. Um dia, a minha mãe passou-se e passei a interessar-me mais pelo verão… tinha ido de comboio para Tavira. Chovia lá fora. Nariz colado ao vidro da carruagem que corria pela paisagem que não me interessava. Só a obliquidade da água que riscava o vidro sujo da janela. Desembarquei no apeadeiro da Porta Nova e pus-me a caminho de casa. Cinco quilómetros até casa sob as nuvens generosas. Nas valetas corriam riachos que desembocariam em ribeiras que levariam a chuva ao mar. Ao mar próximo que sempre me acompanhou. Até ao fim.
Quando passei a amar o verão, descobri as raparigas. Quando passei a amar as raparigas, descobri os livros. E quando os livros entraram na minha vida, o tempo passou a funcionar de uma outra maneira. O que é o tempo? Um rio que corre do passado, atravessa o presente e perde-se, ao longe, fora da vista, no futuro que ninguém deseja. Todos sabemos que um dia irá desaguar no mais incompreensível oceano, o futuro do futuro, a noite mais escura de todas, as trevas mais escuras das trevas: a morte. Agora, o tempo deixou de ser linear, e o antes confunde-se com o depois, que se confundem com o agora e mesmo com o que nunca aconteceu ou acontecerá. Passei a viver em mundos que se cruzam e entrecruzam, mundos que me prendem e arrastam, e amalgamam, e confundem, me transportam para onde não sei se poderei ir, para onde vou sem saber se fico, como folhas num dia ventoso de outono.
Atentai incréus na arte do silêncio.E pur si muove...
... é uma tarde como outra qualquer...
:)CanalSonora(: editora a 37° 7′ 0″ N, 7° 39′ 0″ W
pequenos livros~grandes segredos~volumes portáteis~emoções resguardadas
~ Tem o prazer de anunciar o seu primeiro lançamento de 2014:
‘Espuma Evanescente’ de VITOR G. CARDEIRA (cs03liv.jan14)
«Primeiro ato neste início de ano diluviano. O caminho faz-se caminhando e em janeiro os pés far-se-ão desenhar nas lamas fecundas do restolho agonizante. A vida irrompe onde a morte alimentou os campos de ausência e asperidade. Os dias de março virão e batizaremos a terra de luz e cor. Siga a ação que comando eu. A continuidade é uma mal dita palavra nas noites que introduzem a perenidade das coisas. Das coisas que precedem o silêncio.» (P.19)
É já na segunda-feira, dia de S. João e da grande festa em Tavira, que a moura estará à vista de todos para ser desencantada. Se o será ou não, isso é o que iremos ver nessa, prometida, cálida noite de verão. A Lua gigante estará prenhe sobre todos. Uma trupe constituída por "atores" saídos da comunidade, farmacêuticos, professores, ténicos de finanças, reformados, vendedores de imóveis, artistas plásticos, empregados de restauração e de bar, nadadores salvadores e outros, vão levar à cena, à volta das milenares muralhas da cidade dos encantos, a lenda da moura encantada. Verdadeiro voluntariado artístico depois de horas e horas de ensaio pós-laboral. As cores e os sabores do mediterrâneo, do Sul, à solta pelas colinas da História. Só a loucura será recompensada pelos deuses. "É com bom pão e bom vinho que se faz o caminho..."
Uma produção Armação do Artísta com direção (global) do nosso amigo, e distinto artista tavirense, Vítor Correia.
Meto-me em cada uma... o que me consola, pouco, é que há palermas, poucos, maiores ...
Tavira, 2 de maio, na Biblioteca Álvaro de Campos, perante uma plateia em estado de espanto com as diatribes do introdutor da obra.
Por pudor, e para vos poupar, apresento-vos somente a 1ª parte...
Dormiu 22 anos numa gaveta. Batida numa velha máquina de escrever. Resolvi-me, finalmente. a passá-la para o computador. Noites à lareira a reviver o passado. Duplo passado: o destas terras do fim do mundo e o meu. Cá está o resultado em mais uma edição Cativa.
DIAS 20 E 21 DE JANEIRO,NA BIBLIOTECA MUNICIPAL DE TAVIRA-ÁLVARO DE CAMPOS,PELAS 21H.30M.ESPERAMOS POR SÍ!!!!!!!!!
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